Saturday, November 20, 2010

Como correu a Tertúlia com Teresa Mota e o Milagre das Rosas? julgue cada um pelas fotos e texto

 Dra Teresa Gomes Mota:
Milagre? Lenda? expediente?
O Milagre das Rosas, Isabel de Aragão e a Vila Presépio


Teresa Gomes Mota

Muito bom dia, começo por cumprimentar o Prof. Doutor Luís Nandim de Carvalho e a sua família pela oportunidade e privilégio de participar neste encontro da prestigiada Tertúlia do Bar do Além, e também pelas suas gentis palavras de apresentação.

A todos os presentes os meus agradecimentos pela presença e disponibilidade para ouvirem, durante os próximos minutos, uma pessoa que não é especialista de história, nem de esoterismo, nem de espiritualidade, nem de filosofia… Não professo nenhuma religião, nem partido político, nem quero converter ninguém…

O meu interesse pelo Milagre das Rosas começou na escola, na aula de história sobre o rei D. Dinis (1261 - 1325). E, à semelhança de muitos dos portugueses, manteve-se adormecido no meu subconsciente até há poucos anos, altura em que me comecei a interessar pela vida de Isabel de Aragão, o que conduziu a uma grande transformação na minha vida.

É um pouco dos conhecimentos que adquiri nesta fase, e que ficaram registados num livro que publiquei recentemente “Alma de Isabel - de Aragão ao Chiado”, que venho aqui partilhar convosco. E obviamente esperando que o vosso retorno, como especialistas em assuntos do Além, me alargue os horizontes.

É muito interessante estudar os dados históricos que sustentam a ligação que existe entre a Rainha Santa Isabel (1269?-1336) e vila de Alenquer que teve seu foral em 1212.

Vamos então recuar no tempo, para o século XIII, em que a princesa Isabel de Aragão, então com cerca de 12 anos, casava com o rei de Portugal, D. Dinis (19 anos de idade) e recebia deste em doação pronuptia uma série de vilas e castelos, entre os quais, não consta a vila de Alenquer.

Nesta época era comum as rainhas terem os seus bens e as suas rendas, com as quais sustentavam a sua Casa, e viviam uma vida relativamente independente.

Alenquer figura no primeiro testamento de D. Sancho I a favor de sua mulher D. Dulce de Aragão (1160-1198). Por morte prematura de D. Dulce aos 38 anos de idade, D. Sancho I, em novo testamento, deixa Alenquer à sua segunda filha, D. Sancha (1180-1229), que atribui o primeiro foral a esta vila em 1212. Em 1219 D. Sancha acolheu em Alenquer a primeira missão evangelizadora de frades franciscanos com destino a Marrocos (onde viriam a ser assassinados – ficando conhecidos como os “Mártires de Marrocos”) e pouco tempo depois, em 1222, cedeu o Paço Real para o estabelecimento do primeiro convento franciscano em Portugal - o Convento de S. Francisco de Alenquer. É também aqui que D. Sancha, que mais tarde viria a ser beatificada e conhecida como Rainha Santa Sancha, cria um albergue para doentes pobres e peregrinos.

Posteriormente Alenquer foi doada por D. Afonso III (1210-1279) em casamento a sua segunda mulher D. Beatriz de Gusmão e Castela (1242-1303), mãe de D. Dinis.

Em 1279, já como rainha regente, D. Beatriz, como ficou registado em carta, toma em sua guarda e defesa esta albergaria do Espírito Santo de Alenquer. E em 1290 inicia a construção da igreja do convento, obra que só será terminada depois da sua morte, em 1305 pelo seu filho D. Dinis.

Isabel de Aragão por sua vez também constrói em Alenquer a Igreja do Espírito Santo, nas margens do rio Alenquer, que foi recentemente (2007) reabilitada.
O Bar do Além atento
e a tomar notas hsitóricas da importância de São Francisco
e do Culto do Espirito Santo

Em 1321 concede o “Principio e fundamento da Casa do Spritto Santo”, primeiro compromisso desta confraria, uma das primeiras Confrarias do Espírito Santo em Portugal.

Todas estas circunstâncias ao longo de várias décadas desde o início da nacionalidade dão um cunho a Alenquer de uma Vila de Rainhas, tradição que se vai prolongar por outros reinados.

Mas porque estava D. Isabel em Alenquer e aí empreendia obras, uma vila que não lhe pertencia?

D. Isabel de Aragão veio para esta vila num exílio forçado, ordenado pelo seu marido, ficando impedida de viajar e privada de todas as suas rendas. Isto terá acontecido no final de 1320 sob acusação de favorecer o filho de ambos e pretendente ao trono, D. Afonso IV em luta contra o pai, D. Dinis. Não conhecemos as razões que presidiram à escolha de Alenquer para o exílio, para o convento de S. Francisco.

Foi um episódio seguramente humilhante para uma rainha, na altura com cerca de 51 anos de idade, mas que não despertou nela raiva ou revolta, antes tristeza pela interpretação dada por seu marido aos factos ocorridos.

Em Alenquer escreve a rainha uma carta dirigida ao seu querido irmão D. Jaime, Rei de Aragão, justificando e pedindo a sua intercessão para resolver o conflito:

“Que Deus vos recompense pelos bons sentimentos que tendes demonstrado ao rei, a mim e ao infante D. Afonso nosso filho, querendo tomar parte nas nossas dificuldades, compreendendo tão bem e procurando fazer valer os nossos direitos absolutos e a justiça da nossa atitude. Irmão, sabei que, vendo como as coisas se passam e o estado em que estão, e temendo o futuro, várias vezes pedi ao rei e supliquei a alguns do seu Conselho que tudo fizessem para impedir que não venha um dia pior ainda do que aqueles que já foram; e muitas vezes eu própria fiz tudo quanto pude para recuperar para o infante e para os outros os favores do rei, para que toda a gente viva, como deve ser, para serviço do rei. E Deus sabe que foi e será sempre o meu mais caro desejo, se entretanto estiver no meu poder e for essa a vontade de Deus. Mas tão numerosos têm sido sempre os perturbadores, que eu não pude fazer nada. E Deus sabe quanto desgosto tenho no meu coração, primeiramente por causa do rei, para o qual desejo a vida, a saúde e as honras como para mim mesma; e por causa do infante e da minha própria sorte, já que eu levo uma vida bem amarga (…)”

Este exílio terá gerado alguma contestação, nomeadamente pela impossibilidade legal de D. Dinis privar a mulher de rendas de propriedades que lhe tinham sido atribuídas antenupcial e portanto sob sua exclusiva e intocável jurisdição. Também a Alenquer terão chegado vários alcaides e outras personalidades a prestar lealdade à rainha e oferecer os seus préstimos para fazer frente a D. Dinis, o que segundo os seus cronistas Isabel terá firmemente recusado num sinal de submissão ao poder real do marido e talvez para “impedir que não venha um dia pior ainda do que aqueles que já foram”.

Porventura D. Dinis não a quisesse realmente castigar, talvez a sua intenção fosse apenas afastá-la do seu filho e da sua influência.

Na estadia de D. Isabel em Alenquer há então um paradoxo: por um lado exilada e privada das suas rendas, por outro empreendendo obras, nomeadamente da Albergaria e da Igreja do Divino Espírito Santo. Com que meios?

É neste contexto que se pode compreender uma das lendas do Milagre das Rosas: não tendo dinheiro para pagar aos operários D. Isabel dava-lhes rosas, que depois se transformavam em dobras (moedas) de ouro.

Claro que há quem explique este milagre, dizendo que D. Isabel escondia moedas nas rosas para pagar aos obreiros e assim iludir o rei, ou seja, apesar da real proibição, teria de alguma forma acesso aos seus bens ou às rendas das suas terras que lhe mantivessem fidelidade.

E se na realidade D. Isabel durante este período estava impedida de viajar, pode bem ter recebido e dirigido a sua Casa a partir de Alenquer, que por esta via tivesse conhecido uma maior movimentação e se tornasse mais conhecida. Mas é através da “Casa do Spritto Santo” e do culto do Espírito Santo que Alenquer vai ganhar grande projecção nacional.

Trata-se de uma das primeiras Confrarias do Espírito Santo em Portugal, e embora a nível documental as confrarias mais antigas sejam as de Santa Maria de Sintra e a de Benavente (1237), assim como as festividades associadas, é nesta altura com Isabel de Aragão que o Culto do Espírito Santo terá provavelmente tido grande visibilidade e difusão a partir de Alenquer.

Estas confrarias do Espírito Santo, criadas provavelmente por devotos ligados ao franciscanismo espiritual que nessa altura circulavam pela Europa e chegavam a Portugal, integram-se na tipologia de instituições de caridade e de socorro mútuo formadas por leigos e tendo por orago o Divino Espírito Santo.

A Confraria de Alenquer, teve grande notoriedade. No tempo de Damião de Góis, natural de Alenquer e um ilustre confrade, só entre 1520 e 1577 entraram 1052 novos confrades.

Para compreender o Culto do espírito Santo precisamos de recuar à teoria das três idades de Joaquim de Fiori, um abade calabrês cisterciense que viveu no século XII (1135-1202?). Uma teoria complexa mas que resumidamente se explica do seguinte modo: depois de uma primeira idade sobre os auspícios do Pai, de dependência servil, seguiu-se a era do Filho, iniciada com Jesus Cristo, e estaria para vir uma 3ª idade (que chegou a ser prevista para 1260), a idade do Espírito Santo, (com a revelação próxima do Evangelho Eterno e a entronização do Papa Angélico). Este reinado final de Cristo na Terra, com a duração de mil anos (Apocalipse de S. João) uma era de liberdade, da iluminação de cada um, do diálogo íntimo com Deus, onde não mais seria necessária a intermediação dirigida pela Igreja para aceder ao Divino, pois isso passaria a ser feito directamente por cada ser. Uma idade de Paz, amor fraternal e espiritualidade suprema, verdadeira e derradeira Idade de Ouro do ciclo histórico da Humanidade na terra. Uma visão heterodoxa, que muitos anticorpos terá criado e que foi condenada pela Igreja em 1215.

Estas ideias de Joaquim de Fiori foram largamente difundidas pelos franciscanos através da Europa (incluindo a Corte de Aragão). Ora em Alenquer, como vimos, foi edificado o primeiro convento franciscano em Portugal, pelo que é possível que estas ideias tenham entrado aqui muito cedo.

A ordem de S. Francisco era uma ordem de pregadores, missionários e viajantes, que se propunham viver fora do claustro e levar a palavra e o exemplo de Cristo ao povo e aos infiéis. Outra originalidade desta ordem foi a criação de uma ordem laica, a Ordem Terceira.

Os franciscanos representam o estímulo renovador, a tendência à observação da Natureza e as aspirações à liberdade individual. Desde o início do século XIII que se propaga entre os franciscanos a heresia dos irmãos espirituais, com estrita observância do voto de pobreza, adeptos fervorosos do joaquimismo e crentes que estava eminente o advento da Idade do Espírito Santo.

(mesa da sala 1- a mesa da oradora)

E reconhecemos facilmente nos portugueses estas raízes franciscanas no serviço aos seus semelhantes, sobretudo pobres e humildes, no apreço pela liberdade, no fascínio pelos grandes ideais que nos levaram a embarcar em pequenas caravelas e enfrentar os mares. Rumo aos desígnios da expansão planetária, da evangelização dos povos, da preparação do império prometido (V Império) que há-de de ser português, como anunciado pelo Padre António Vieira, Camões ou Fernando Pessoa: império e nova idade não de mera abundância de bens materiais, mas da superabundância dos bens do espírito.

Mas voltando a Alenquer, é a partir daqui que o Culto do Espírito Santo ganha grande fôlego e notoriedade com o impulso real e se difunde para o resto do país, provavelmente através dos franciscanos e da ordem de Cristo, atingindo o seu auge nos séculos XV e XVI. (Jaime Cortesão conta, no final do século XVI, 75 vilas e cidades onde existiam templos da sua invocação, 80 hospitais e albergues com as respectivas capelas, cerca de 1 milhar de igrejas, conventos e ermidas que possuíam confrarias do Espírito Santo nas quais se realizavam procissões, festas e romarias); o culto embarca e celebra-se nas caravelas, chega aos Açores, à Madeira, ao Brasil, e também a África e ao Oriente. Mais tarde, pela acção dos emigrantes açorianos é introduzido nos EUA e Canadá onde ainda hoje é celebrado.

Uma forma de culto laica, oficiada por um mordomo, em algumas confrarias por uma mulher, com coroação de crianças, com foliões, com abundante bodo comunitário (pão, carne e vinho), celebrada entre a Páscoa e o Domingo de Pentecostes. As festas no Pentecostes têm uma origem anterior à era cristã, a festa das colheitas, a celebração da abundância e que como tantas outras celebrações populares foi adaptada ao cristianismo.

Sem querer desviar-me do tema que me trouxe aqui, lembrar-vos apenas que a difusão do Culto teve o seu auge nos séculos XV e XVI, tendo em Alenquer estas festas particular brilho e tal fama que atraía gente de vários pontos do país.

Em virtude de alegados excessos e extravagâncias, começam depois a ser alvo de diversas limitações e proibições de vários aspectos do culto, e também a integração das confrarias ou irmandades nas Misericórdias, são factores apontados para a progressiva extinção do culto na maioria das localidades.

Mas ele resistiu e permanece bem vivo ainda e com a sua componente de rito espiritual de raiz popular sobretudo nos Açores, mas também na Madeira, no Brasil, nos EUA, Canadá...

Em Alenquer onde as festividades eram célebres e atraíam pessoas de vários pontos do país, o culto do Espírito Santo extinguiu-se há cerca de 200 anos; foi novamente celebrado uma única vez no ano de 1945, e depois de forma regular desde 2007, ano da recuperação da Igreja do Espírito Santo.



Depois desta descrição do contexto, ou “cenário” em que surge o “Milagre das Rosas”, passemos aos factos de que dispomos actualmente:

A primeira referência histórica ao milagre das rosas a que temos acesso é um retábulo quatrocentista (conservado no Museu Nacional de Arte da Catalunha?) e uma descrição incluída na Crónica dos Frades Menores (Frei Marcos de Lisboa, 1562) sendo que nesta versão inicial são moedas que se transformam em rosas.

“Levava uma vez a

Rainha Santa

moedas no regaço

para dar aos pobres(…)

Encontrando-a el-

Rei lhe perguntou o

que levava, (…) ela

disse, levo aqui

rosas. E rosas viu el-Rei não sendo

tempo delas”

Em meados do século XVI já a lenda do Milagre das Rosas estava largamente difundida e ilustrada. “Rainha Santa Isabel” (Museu Machado de Castro em Coimbra), Iluminura da “Geneologia dos Reis de Portugal” de Simão Bening sobre desenho de António de Holand. Do século XVII dois trabalhos anónimos, uma pintura a óleo (átrio do Instituto de Odivelas) e um retábulo (mosteiro de Lorvão). Depois disso e até aos dias de hoje sucedem-se inúmeras referências na escrita, música, pintura, escultura, filmes, teatro, etc.

As versões do milagre são várias, rosas transformadas em moedas, ou o milagre inverso de moedas transformadas em rosas, ou, mais comum nos dias de hoje, o pão para os pobres que se transforma em rosas.

Nesta versão mais popular, ocorrida numa altura de más colheitas, em que a fome alastrava pela Europa, D. Isabel recorrendo às reservas de trigo guardadas nos celeiros da sua Casa, mandava fazer pão que distribuía aos pobres. D. Dinis preocupado com o gastar dessas reservas opunha-se a esta prática e num dia do mês de Janeiro, em Coimbra, surpreende a rainha. Quando a rainha mostra o que leva no regaço, os Pães tinham-se transformado em rosas.

atenção pelas palavras da oradora e pelos slides projectados

Antes de passar à próxima fase gostaria de ter acesso às vossas mentes para saber que expectativas trazem em relação a este tema. O que sabem sobre o Milagre das Rosas, ou, ainda mais importante, o que intuem sobre ele. O que gostariam de saber, ou talvez, de ouvir alguém dizer em voz alta sobre algo que pressentem dentro de vós.

E é esta tarefa (impossível?) que me trouxe hoje a Alenquer.

Uma questão que naturalmente se põe é se realmente o milagre existiu, ou algum episódio que esteja na base desta lenda, ou se esta lenda foi criada já depois da morte da rainha. São então várias as hipóteses:

• Não se tratou realmente de um milagre mas de um artifício, um truque para iludir o rei

Já vos falei na versão das moedas dentro das rosas como um expediente para pagar aos operários na construção da Igreja do Espírito Santo em Alenquer.

Mas que explicação poderíamos encontrar para a versão mais popular do milagre, em que o Pão se transforma em rosas?

As rosas são uma flor conhecida desde a antiguidade existindo na época medieval espécies arbustivas ou de trepar, que florescem apenas uma vez por ano. Só a partir do século XVIII começaram a chegar rosas da China com floração contínua. Daí que haver rosas no Inverno era muito pouco plausível na época de Isabel de Aragão. No entanto…

Há notícia de que o cavaleiro Robert de Brie no regresso das cruzadas (entre 1254 e 1276) trouxe para França uma variedade de rosas vinda de Damasco – Pérsia (Damascena bifera, quatro estações) que florescia todo o ano. É possível que tivesse chegado a Portugal e florescesse nos jardins das rainhas…

Então seria uma possibilidade o seguinte: a Rainha levava um avental cheio de pão para distribuir aos pobres, e atrás vinha uma aia com um avental cheio de rosas (Damascenas?) colhidas em Janeiro no jardim. Quando o rei se aproxima trocam-se rapidamente os aventais e… “São rosas, senhor, são rosas”.

• Uma lenda: o milagre não existiu, ou quando muito existiu um episódio base que mais tarde foi transformado pela tradição oral em milagre.

A descrição do milagre das rosas não consta da biografia anónima sobre a rainha, o documento mais antigo que dispomos sobre a sua vida. Esta Relação ou Lenda da Rainha Santa, como é conhecida, foi escrita talvez por um contemporâneo (Frei Salvado Martins, Bispo de Lamego, seu confessor) e faz parte da Monarchia Lusitana (vol VI) publicada no século XVI. Nesta “Lenda” existe uma listagem bastante circunstanciada e detalhada dos milagres da rainha, com testemunhos, pelo que seria de esperar que, a ter existido, o milagre figurasse aqui. Como já vimos não existe nenhuma referência histórica contemporânea da rainha ao milagre das rosas, e também não consta dos autos de beatificação da rainha.

Outro dado interessante: existem outros milagres semelhantes e anteriores no tempo como nos recorda Lima de Freitas:

- Santa Isabel de Hungria e da Turíngia, tia Avó de Isabel de Aragão, e a quem é dedicado o Mosteiro de Santa Clara-a-Velha mandado construir pela Rainha Santa em Coimbra. Morreu muito jovem, com o hábito da Ordem Terceira de S. Francisco.

- Santa Roseline, ou Rosa de Viterbo (1263-1329), francesa, também franciscana (filha de Arnaldo de Vilanova que frequentava a corte de Aragão e com quem Isabel de Aragão poderá ter estado em contacto). O seu corpo incorrupto foi depositado em urna de vidro.

É pois possível, provável, que tenha sido uma lenda criada e difundida pelos franciscanos.

E que interesse poderia haver na criação de semelhante lenda?

A Rosa tem um valor simbólico muito forte, é símbolo de renascimento, de amor, do coração, é considerada a flor de Portugal, símbolo feminino, de útero, de Graal, o lótus do ocidente, emblema rosicruciano e tantos outros…

Ver rosas em lugar de pão é, como afirma Gilbert Durand, ver com os olhos da alma. A transmutação de alimento do corpo (pão ou dinheiro) em alimento para o espírito (rosas) vem apoiar a teoria da terceira idade, a passagem para uma nova era. E a fixação desta lenda na rainha de Portugal, grande impulsionadora do Culto do Espírito Santo, vai encontrar eco nos que atribuem um papel importante a Portugal nesta Missão.

Apoiando esta tese da missão espiritual de Portugal no Mundo encontramos a nível artístico os painéis de S. Vicente (investidura de Portugal pelo Espírito Santo) e importantes figuras como Padre António Vieira, Camões, Fernando Pessoa, Agostinho da Silva, entre muitos, muitos outros.

E em Portugal tudo isto nasce em Alenquer, que pode assim ser considerado o berço desta terceira idade, de espiritualidade, de paz e de fraternidade universal. Depois de Jerusalém (onde teve início a era de Cristo), Alenquer (a quem se atribuem muitas semelhanças com Jerusalém) poderá ser a Vila presépio da Nova Era.

(E lembro que o presépio foi inventado por S. Francisco em 1223)

• O milagre existiu mesmo

Os milagres estão associados à realização ou acontecimento de algo reconhecidamente muito improvável, e que não tenha uma explicação do seu mecanismo à luz dos conhecimentos da época em que se realizam. Ou seja, algo impossível de suceder, mas que efectivamente (há testemunhos de que) aconteceu e que constitui de certa forma uma prova de que Deus existe. Estes milagres são assim uma via de aprofundamento da Fé para os crentes e instrumento de conversão à Fé para os não crentes.

Desde Jesus Cristo e dos seus milagres praticados em vida, e depois da sua morte, que a realização de milagres (e muito particularmente na cura de doenças – a chamada missão curandeira de Cristo) ficou associada à santidade de quem os pratica. Constitui inclusivamente um dos requisitos para a canonização pela Igreja Católica.

Mas a evolução científica permite-nos hoje o uso de técnicas absolutamente banais, como por exemplo, o telefone, ou um antibiótico, que seriam há dois séculos atrás consideradas milagres. E o mesmo poderemos imaginar que vá acontecer no futuro ao evoluirmos da física Newtoniana muito condicionada pelos conceitos de tempo e espaço. Hoje ao admitirmos os novos conceitos da física quântica, começamos a levantar um véu sobre muitos outros fenómenos até aqui desconhecidos e inclusivamente a possibilidade de os manipularmos.

Então nesta época de divinização da ciência, deixo-vos a pergunta: existem milagres ou apenas uma falta de conhecimento? Em que milagres estamos dispostos a acreditar?

Visitei a Igreja do Espírito Santo de Alenquer em Outubro.

Estava um dia chuvoso, cheguei a meio da tarde e o acaso levou-me directamente à igreja. Estava vazia. Quando abri os olhos depois das minha orações, verifiquei que o sol entrava pela janela do topo, o que, estando virada a Norte e num dia de Outono chuvoso era bastante improvável que acontecesse. A luz reflectia-se na parede lateral e encandeava os meus olhos. Foram momentos mágicos.


 
 (sala 2)
Mas sentia um peso no peito.


Fui depois ao convento de S. Francisco. Fortemente abalado pelo terramoto de 1755, da estrutura original medieval conserva-se a frontaria da Igreja.

Visitei o claustro, muito bonito e cuidado, a sala do capítulo, não pude deixar de reparar nas rosas nos capitéis das colunas. Não havia ninguém para me guiar na visita, escapou-me o relógio de sol oferecido por Damião de Góis, ou a capela de D. Sancha.

No piso superior existe um lar de idosos da Misericórdia, o que está dentro da vocação original do convento com a sua albergaria. Passei por entre duas filas de cadeiras onde estavam sentados, frente a frente, talvez 30 homens idosos. Da cozinha ouvia-se a azáfama e sentia-se o cheiro agradável da refeição em preparação. À medida que ia andando e cumprimentando, dos residentes, de olhar parado, poucas respostas obtive. Bem vestidos e alimentados, confortáveis, tranquilos… Tal como na maioria dos lares de idosos, pressenti uma grande pobreza, a um outro nível, não a falta de alimento para o corpo, mas para a Alma. O peso no meu peito acentuou-se.

Voltei à borda do rio para fotografar a Igreja do Espírito Santo. A água passava barrenta. Uma mensagem de uma pessoa amiga lembrava-me o dia em que estávamos, 10-10-10, dia muito especial de abertura de portal energético, de como era importante libertar tudo o que não presta, deixar ir, criar espaço em nós para que outras coisas possam entrar.

Assim fiz, deixei ir com o rio Alenquer as mágoas, tristezas, decepções, culpas, apegos indefinidos.

O que aconteceu depois é difícil de vos explicar, foi como que uma abertura do meu coração, uma luz irradiando directamente do meu peito. Um estado de maravilhoso bem-estar que me acompanhou alguns dias.

Pouco tempo depois quando preparava esta palestra e procurava na internet imagens do Milagre das Rosas, a primeira que me apareceu foi esta pintura do Mestre Lima de Freitas (acrílico sobre madeira - 1987), de que passei a ter uma diferente e mais profunda compreensão.

(aspecto do almoço debate)
Para terminar diria que, tenha ou não existido, o significado do Milagre das Rosas mexe com os portugueses (para não dizer com o ser humano) de tal forma, que a lenda perdura há muitos séculos e a sua simbologia permanece bem viva na nossa cultura, como se de todos os milagres, este fosse O Milagre em que estamos dispostos a acreditar.

O Milagre das Rosas, que se associa ao culto do Espírito Santo de inspiração franciscana e cuja celebração se iniciou em Alenquer há quase sete séculos, esta Vila Presépio que ostenta 14 rosas no seu brasão, fala-nos de transformação, de renascimento, anuncia o despertar, o elevar da consciência.

Anuncia-nos o novo tempo em que em vez de assistirmos passivamente à realização de milagres (em que já não acreditamos), operamos o milagre em nós.

É um dos mitos fundamentais que nos orienta o caminho, nos indica uma saída iluminando-nos para a nossa verdadeira essência, se tivermos a vontade e a coragem de abrir os olhos da alma, o coração.

Ver Rosas em vez de pão é o Milagre que espera ser realizado em nós.



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